Nicolás Otamendi, 34, abre um sorriso quando um jornalista de TV o lembra, na saída do estádio Al Rayyan, que este “pode ser o ano”.
“Oxalá que seja”, diz, antes de seguir sua caminhada para o ônibus após a vitória sobre a Austrália pelas oitavas de final.
Segundos depois, quando funcionário da Fifa quase o abraçou para que parasse diante de repórteres da imprensa escrita, ele se livrou do pedido sem cerimônia, como se a pessoa à sua frente não existisse. O empregado olhou para assessor da AFA (Associação de Futebol Argentino), que deu de ombros. Era como quem diz ‘Otamendi é assim mesmo’.
Não é o primeiro a constatar isso.
“Em campo, ele é um animal. Fora dele, é um bicho de pelúcia. É uma beleza, desliga o meu iPad, me cobre, é bonito de ver. Depois ele te pega em campo e te assassina”, constatou, com claro divertimento, o meia Rodrigo De Paul, colega de quarto do defensor na concentração da equipe, na Universidade de Qatar.
Outros colegas de Otamendi, no passado, já disseram coisas parecidas. O uruguaio Darwin Sánchez confessou detestar seu novo companheiro ao chegar ao Benfica, de Portugal. Em poucos meses eram melhores amigos.
“É alguém que vai à luta com você em todos os momentos, sem receio. É um guerreiro total”, disse.
Em seu provável último Mundial da carreira (assim como Messi), o zagueiro tem contas a acertar. É o torneio em que já foi massacrado, esquecido de forma surpreendente e tomou parte em um fiasco histórico. Em 2022, no Qatar, tem a esperança que dê enfim tudo certo.
“Estamos vivendo um momento muito feliz, melhorando cada vez mais, passo a passo, mas ainda não é nada. Há muito mais por lutar”, disse após o resultado que definiu confronto contra a Holanda, na próxima sexta-feira (9), pelas quartas de final.
Lutar é um verbo comum para quem praticou boxe na infância, antes de ser descoberto pelas categorias de base do Vélez Sarsfield. Foi pelo time que foi chamado à primeira Copa, na África do Sul, em 2010. Acabou massacrado pela imprensa do seu país após a goleada por 4 a 0 sofrida diante da Alemanha, nas quartas de final.
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Pouco importa que o técnico Diego Maradona o tenha escalado como lateral direito, posição em que nunca havia atuado pela seleção.
Guardiola concorda com a visão de que Otamendi vai para a batalha toda vez que pisa no gramado. Definiu-o como o maior competidor que já viu na vida. O treinador o dirigiu no Manchester City entre 2015 e 2020. Diz que o viu atuar com 20 pontos na perna, com tornozelo arrebentado… Chamou-o de super-homem.
Era um nome considerado certo na lista dos 23 convocados por Alejandro Sabella para o Mundial do Brasil, em 2014. Foi deixado de fora, em decisão surpreendente. Não participou da campanha em que a seleção chegou à final e foi derrotada de novo pela Alemanha.
Restabelecido no elenco nacional a partir de 2015, era titular na Rússia-2018, quando o time se esfacelou durante o Mundial, passou no sufoco pela fase de grupos e acabou caindo diante da França nas oitavas de final.
Se o futebol desse um título de Copa do Mundo a Lionel Messi, o zagueiro também espera ter um bom momento no maior palco do esporte.
“Estamos ansiosos pelo que está por vir, mas a Argentina é uma seleção que reage bem sob pressão. Foi isso o que aconteceu contra o México”, observou, sobre o jogo em que a vitória era essencial, após o revés na estreia contra a Arábia Saudita.
Se a Argentina conquistar o título mundial, será mais fácil para ele realizar o sonho de atuar pelo River Plate, seu time de infância.
No momento, o zagueiro, chamado de traidor pela torcida do Porto, por onde atuou entre 2010 e 2014, quando assinou com o Benfica em 2020, tende a renovar o contrato com o clube de Lisboa.
Para que isso aconteça, é possível um histórico jogo contra o Brasil na semifinal. Na última vez em que as duas seleções se enfrentaram, ele mostrou o seu lado não delicado para Raphinha, titular de Tite na Copa. Acertou cotovelada no atacante e não recebeu sequer cartão amarelo, o que gerou reclamação dos dirigentes brasileiros.
“Apenas bola”, escreveu em postagem no Instagram, com ironia, sobre a jogada.